terça-feira, 31 de maio de 2005

Silêncio, solidão e paz, please

desde o momento em que eu acordei da soneca da tarde eu estou de mau-humor. foi meio repentino porque tive um dia ok, de um modo geral, e de repente lá está aquele bode, a cara amarrada. bom, em partes posso explicar isso porque estou saturada de algumas coisas. estou saturada dessa reforma aqui em casa, e olha que tá só começando. to saturada de trocar sorrisinhos com o responsável pela obra, de esbarrar em homens desconhecidos pelo corredor de casa, de acordar com o bate estaca. to saturada dos comentários pretensamente engraçadinhos da moça que trabalha aqui em casa, e de como ela pode ser invasiva – na verdade, ela consegue ser invasiva quase sempre. comendo na mesa da cozinha ou deitada vendo um filme no quarto, preservando meu silêncio, sou obrigada a ouvir os comentários dela. sei que isso soa, e é, ranzinza, mas posso fazer o que se isso me incomoda demais? já liguei o foda-se porque nem respondo, então fico pagando de chata, mas nem isso adianta, pelo jeito. saudosa época em que minha fama de chata afastava essas pessoas de mim. to saturada de minha tia, rondando pela casa, me cerceando só com sua presença católica-conservadora e sua inabalável necessidade de falar. minha mãe e joanna disseram que sou impiedosa porque não entendo que ela, uma senhora de idade sem ter muito com quem conversar, precise ficar falando, em altíssimo tom, o tempo quase todo. posso fazer o que número 2, acho a velhice decrépita e quase indecente de tão feia. acordei emputecida porque tinha um tanto de coisas a fazer e disposição nenhuma. acordei emputecida pelo velho motivo de ‘ter coisas a fazer’ me sufocar, me deixar sem horizonte. acordei sem vontade, rolei na cama, e não tava com o mood pra lidar com as pessoas. e isso se seguiu e se seguiu até agora. pouco atrás, tive que me conter pra não ter uma reação super emocional com joanna – e ela tá no humor que eu considero bom, falante, sorridente. e eu com uma semi vontade de chorar e de explodir. foda-se, eu quero só silêncio, solidão e paz.

sexta-feira, 27 de maio de 2005

música pop e nick hornby

É, aconteceu. Eu viciei totalmente em uma música pop meio xexelenta - exatamente como Nick Hornby narra em "31 Songs", sobre "I'm Like a Bird". E foi de uma maneira infame. Eu estava vendo "América" (sim, eu o faço, ocasionalmente) e ouvi uma música que me chamou a atenção. Copiei um pedaço da letra, depois coloquei no Google, descobri o nome e baixei (como vive quem não tem internet?). Passei a ouvir o dia inteiro no PC - até que atingiu um alto grau de vício e eu comprei "América Internacional" pirata. O CD dói de tão ruim. Fica no repeat na faixa 10 o tempo todo, pois as outras faixas dão ânsia de vômito. Agora mesmo, nesse instante, ela toca pela 8º vez consecutiva. Tá, é a hora. A música é "Piesces of Me", de Ashlee Simpson. Quem? Tudo bem, pra mim ela é também totalmente desconhecida - até hoje tenho medo de googlar esse nome. Eu sei, Joanna me disse, que ela é irmã de Jessica Simpson, portanto posso imaginá-la, loirinha, inssossa, sorriso colgate. É dramático. Claro que não chega ao nível de tristeza que é gostar da última música de Britney Spears ("Do Something") e da última do Black Eyed Peas ("Don't Phunk With My Heart", com um clipe que lembra muito o do Outkast) - culpa da Transamérica, que eu escuto quase todo dia agora, indo pra faculdade, porque o som do carro de Júlio tá quebrado, não pega CD. Bom, é respirar fundo e seguir adiante - um dia, como disse o sábio Nick, a música se esgota. Então vejam o que ele falou, no terceiro capítulo do livro, a pretexto de "I´m Like a Bird", Nelly Furtado:

***

"Oh, claro que posso entender o menosprezo das pessoas pela música pop. Sei que uma grande parte dela, quase toda, é lixo, sem a menor imaginação, mal escrita, vazia, repetitiva, imatura (embora pelo menos quatro desses adjetivos possam ser usados para descrever os incessantes ataques ao pop que ainda encontramos em revistas e jornais de níveis); também sei, acreditem, que Cole Porter era "melhor" do que Madonna ou Travis, que a maioria das canções pop é dirigida cinicamente a um público-alvo três décadas mais jovem do que eu, que a época de ouro foi há trinta e cinco anos e que desde então houve pouquíssima coisa significativa. Só que tem essa canção que ouvi no rádio e comprei o CD e agora tenho que ouvi-la dez ou quinze vezes por dia... Essa é a coisa que me intriga naquelas pessoas que têm a sensação de que o pop contemporâneo (e uso a expressão para abranger soul, reggae country, rock - toda e qualquer coisa que possa ser tachada de lixo) está abaixo, atrás ou além delas - ou qualquer outro advérbio denotando distância: isso significa que nunca curtem novas canções, que tudo que assobiam ou cantarolam foi escrito há anos, décadas, séculos? Vocês realmente se negam o prazer de aprender uma melodia (casualmente, um prazer que a geração de vocês seria talvez a primeira na história da humanidade a renunciar) por medo de que pareça que não sabem quem é Harold Bloom? Uau. Aposto que vocês são muito divertidos em festas. A canção que tem me proporcionado uma agradável bobeira nos últimos tempos é "I´m Like a Bird", de Nelly Furtado. Só a história poderá julgar se a srta. Furtado vem a ser alguma espécie de artista e, embora eu tenha minhas suspeitas de que ela não vá mudar a maneira como vemos o mundo, não posso dizer que estou muito chateado: serei grato a ela para sempre por criar em mim a necessidade narcotizante de ouvir sua canção sem parar. Afinal de contas, é uma necessidade inofensiva, que pode ser facilmente satisfeita, e existem poucas desse tipo no mundo. Nem desejo criar polêmica em torno dessa canção - mas acontece que eu acho que é uma canção pop muito boa, com uma languidez sonhadora e um otimismo doído que a distingue de imediato de suas similares anêmicas e atrofiadas. A questão é que há poucos meses ela não existia, pelo menos ao que soubéssemos, e agora ela está aí e isso em si é um pequeno milagre. Dave Eggers tem uma teoria de que ouvimos certas canções repetidamente, aqueles de nós que o fazem, porque temos que "liquidá-las", e é verdade que, no princípio de nosso namoro com uma nova canção, existe uma fase semelhante a uma espécie de perplexidade emocional. Existe um pouquinho disso em "I'm Like a Bird", por exemplo, lá pelo meio da música, quando a voz surge em dois canais em um verso, e o efeito - especialmente sobre alguém que não é músico, alguém que adora e valoriza música, mas fica desconcertado e encantado até com o mais ismples dos truques musicais - é saboroso, desconhecido e viciante. Claro que muito em breve ela vai parecer fraca e batida. Não vai demorar muito para que eu tenha "liquidado" "I'm Like a Bird" e não deseje mais ouvi-la tanto - afinal de contas, uma canção pop de três minutos consegue manter seus mistérios somente por um tempo. Portanto, sim, ela é descartável, como se isso fizesse alguma diferença na percepção de alguém sobre o valor da música pop. Mas então já não deveríamos estar fartos da "Sonata ao Luar"? Ou de "Christina's World"? Ou de "A Importância de ser prudente"? Elas estão zeradas! Não sobrou nada! Nós as sugamos até a última gota! É isso que me intriga: as mesmas pessoas que torcem o nariz para o pop descartável irão rever inúmeras vezes a cena em que Lady Bracknell diz: "Uma bolsa?", com uma voz engraçada. Será que não acham que a piada já se esgotou? Talvez a descartabilidade seja um sinal de maturidade da música pop, um reconhecimento de suas próprias limitações, em vez do contrário. Seja como for, um dia desses eu estava sentado na sala de espera de um médico, quando, de repente, quatro garotinhas afro-caribenhas que aguardavam pacientemente enquanto sua mãe consultava engataram na canção de Nelly Furtado. Elas sabiam a letracom exatidão, faziam uns passos de dança e cantavam com enorme entusiasmo e prazer e gostei de que tivéssemos algo em comum temporariamente; senti como se todos nós vivêssemos no mesmo mundo e isso não é algo que aconteça com muita freqüência. Umas duas vezes por ano gravo uma fita para ouvir no carro, uma fita com todas as novas canções que adorei ouvir nos últimos meses e, cada vez que concluo uma dessas gravações, não posso acreditar que haverá outra. Contudo, sempre há outra e mal posso esperar pela próxima. Você precisa de apenas mais umas poucas centenas de coisinhas como essa para ter uma vida que valha a pena ser vivida."